Benjamin Teixeira
pelo espírito
Gustavo Henrique.

Há quatro mil e quinhentos anos, fui componente da corte de “anciães sábios” que aconselhava o governador da cidade de Tebas, no antigo Egito. Eram tempos difíceis aqueles. Estávamos, em verdade, instituindo as primeiras bases da civilização, tratando com entidades altamente primitivas, encarnadas em massa, na condição de povo a ser liderado, muito próximas, em termos evolutivos, dos brutos. Não existia muita diferença entre lidar com bestas e pessoas por aqueles dias. Havia selvageria, brutalidade por parte dos governantes, mas, em contrapartida, também muita desordem, indisciplina e desequilíbrio da parte de uma população recém-egressa do reino animal de consciência.

Meu governador, discípulo querido que criei desde cedo, assumindo as funções de seu preceptor – sentindo-o, portanto, quase como um filho -, possuía natureza extremamente temperamental. Egóico e vaidoso como todos os grandes líderes da Antigüidade, era, no entanto, visivelmente, um ser ultradesenvolvido para a época. Tinha paixões claramente despertas, em meio a uma mole de seres ignaros e pré-egóicos, preocupados, tão-somente, em manterem-se vivos em meio a uma realidade dura e adversa, tanto em termos naturais como sociais.

Sua mãe era mulher de elegância ímpar. Altiva e nobre, apresentava virtudes muito acima de seu tempo, que impressionariam até hoje, como uma imperturbável serenidade e uma capacidade de julgar friamente diante de situações as mais desesperadoras, fazendo-se sempre a voz final, em tempos de crise. Precisamos, por exemplo, certa feita, debelar, de última hora, uma sublevação de grandes proporções, durante uma seca mais prolongada. Foi ela o fio de prumo que nos manteve dentro da lógica e do bom senso, quando todos estávamos – para simplificar – histéricos, inclusive os integrantes do conselho de anciães, transtornados pelo receio de sermos linchados por populares iracundos. Hoje, é grande espírito de luz, alcandorada com as virtudes acumuladas em quarenta e cinco séculos passados, mas já constituía, por aqueles dias, indubitavelmente, nosso extraordinário farol de lucidez e sabedoria. Mais tarde, em Grécia Antiga, reencontrar-nos-íamos (eu e muitos de meus companheiros daquela reencarnação longínqua) com a notável mentora, que retornaria na condição de Aspásia de Mileto, a grande filósofa, esposa de Péricles, o que deu o nome ao século V antes de Cristo.

Traz-me aqui, hoje, o desejo de apresentar o relato de um homem que viveu, no plano físico, durante o milénio terceiro antes de Cristo, e que acompanhou os progressos da humanidade, pari passu, de lá para cá. Posso dizer, de sã consciência, embora eu próprio estivesse, por aqueles anos de primitivismo, mergulhado no mesmo padrão de violência e paixões desgovernadas da maioria dos componentes da elite social (quanto das massas populares), que já havia beleza e graça entre raros partícipes de nossa espécie humana, conquanto não tivessem muito como manifestar seu gosto refinado. Nossa “rainha-mãe”, se é que assim podemos dizer, era lídima representante deste grupo seletíssimo, uma alma solitária e generosa, em meio a alimárias sobre dois pés. Seu filho, entretanto, por mais estranho  que possa soar esta assertiva à primeira vista, era mais necessário àqueles dias que ela, pois que, enquanto a sabedoria da mãe do governador agia para acalmar os ânimos em tempos de turbilhão inextricável, para que todos pudessem pensar corretamente, ele era o motor de paixões e vontades que fazia aquele sistema social funcionar, com punho de ferro – a única forma de governar que seria possível num mundo primitivo. Graças a atitudes enérgicas de governantes despóticos da Antigüidade como ele, e que hoje seriam consideradas genocidas – como a execução sistemática de todos que se sublevassem contra a ordem instituída –, é que se foram, lentamente, estabelecendo parâmetros elementares de organização sócio-política e o espírito de respeito à lei, indispensáveis à vida em sociedade.

Nosso governador está de volta, em trabalho bem diferente que o daqueles dias, e sua mãe, à distância, acompanha-o. Tempos bastante mudados, necessidades diversas, modos igualmente distintos de agir…

Quatro mil e quinhentos anos depois, contudo, continuamos admirados da grande sabedoria, cada vez mais luminífera, da Grande Mãe Sol, que nos inspira e acalenta as almas… sempre…


(Texto psicografado em 31 de dezembro de 2006. Revisão de Delano Mothé.)


(*) Para não gerarmos especulações indevidas, esclareço, antecipadamente, que, por declaração do próprio autor espiritual deste artigo, tive ciência da identidade do tal “tirano” reencarnado, e posso afiançar não se tratar de nenhuma personalidade política da atualidade.

(Nota do Médium)