Benjamin Teixeira
pelo espírito
Gustavo Henrique.

O prazer grosseiro é uma vulgaridade bruta. O apreciar é uma arte fina e espiritual. Um estivador delicia-se com temperos fortes e bebidas com alto teor alcoólico. Em suma, não sente sabor de quase nada, a não ser do álcool e dos condimentos mais intensos. Come muito, come rápido e se empanturra, sem obedecer ao comando da saciedade. Um gourmet refinado degusta o sabor original dos alimentos com pequenas pitadas de condimento; pode beber, mas pouco e com pouca concentração alcoólica. Come pouco, devagar e pára bem antes do mal-estar do empanzinamento. Por fim, acaba tendo enormes doses de prazer, em diversos níveis, incluindo o estético (a arrumação dos alimentos, da mesa, pratos e talheres, música ambiente e companhias são igualmente apreciados, numa longa e multidimensional sessão de degustação suave e profunda), enquanto o estivador apenas saciou um apetite bestial, calando, aos socos no estômago, a premência da preservação do corpo.

Refine seus sentimentos, seu paladar, seus hábitos, seus valores. O mal não está no prazer, na felicidade pessoal, e sim na forma com se os buscam. Se você é uma mente complexa e uma alma refinada, não será de qualquer jeito que auferirá satisfação para si. Assim, o que para outros parecerá etiqueta ou “frescura”, para você constituía estilo e elegância, senão estrutura e natureza suas.

De fato, alguns excessos são artificiais e destituídos de propósito, e o bom senso os revela facilmente. Voltemos ao exemplo da mesa: na verdade, não importa muito se está usando o talher ou o prato certo para um alimento. Mas se você come calmamente, mastigando diversas vezes e devagar, degustando o alimento, não só aumenta a quota de prazer, com menos calorias ingeridas, como ainda favorece a boa digestão, que começa na boca. Em 20 minutos, o cérebro estará sinalizando saciedade, e, comendo tão tranquilamente, um gastrônomo requintado nunca se sente tentado a comer demais. Já no ritmo de um grosseirão, em 20 minutos uma terrina já foi devorada.

Assim, seja sincero, mas sem grossuras igualmente. Não diga tudo a seu respeito. Ninguém quer saber como gosta de fazer sexo, a não ser que seja um degenerado ou esteja profundamente interessado em você, no sentido sexual, e provavelmente deixará para colher tal informação em ocasião adequada. Fale com modéstia (sem falsidade), com decoro (para não incorrer no deslize deplorável da maledicência), com pudor (para não resvalar a falar de si).

Se falam de você, se já cometeu erros, fie-se em seus acertos de hoje, e estará, lentamente, refazendo sua imagem ante as pessoas e a opinião pública. Se você é um galante inveterado, regenere-se verdadeiramente, e isso ficará óbvio para os olhos perspicazes. Pratique o bem e o volume das boas obras calará, envergonhadas, as bocas mais mordazes.

Se tem suspeitas de que parceiro está sendo infiel ou na iminência disso, não ligue para seu celular, cobrando-lhe com quem está ou onde está. Se for imperiosamente necessário falar com ele, pode até ligar, mas proibindo-se perguntar sobre lugar e companhias. Principalmente, seja uma pessoa gentil e amorosa em sua volta da aventura, ou do que supõe ter sido uma aventura – muitas vezes em bem acabados surtos de delírio de ciúme – e dê ao seu cônjuge motivos de ficar com remorsos, e reduzir a prática indevida – caso exista – e não com raiva, se cobrar, pois que com as pressões da cobrança, do controle, será tentando a continuar reincidindo no erro que já vem cometendo ou a incorrer, se está tentando a fazê-lo, por sentir-se injustiçado e perseguido, pressionado e caluniado sem razão e, então, precipitar um término do relacionamento, quando já não bastasse o inferno psicológico que se estabelece entre os casais, quando brigas de ciúmes se fazem uma constante. Claro que se um companheiro ou companheira for um inveterado cafajeste, cabe-lhe falar abertamente sobre, estabelecer ultimatos, baseados no mínimo ético do que considera tolerável numa relação, e, em caso de nenhuma mudança substancial da parte dele ou dela, romper a relação sumariamente, de modo prático, racional e civilizado. Mais uma vez, sem baixaria, vexame ou histerias. Em resumo: para qualquer situação, a atitude fleumática, serena, e racional é sempre a melhor. Portanto, da próxima vez que for ter um acesso de ciúme, e os pensamentos egoístas de: “Isso é uma injustiça!”, “Eu não mereço isso!”, “Ele(ela) vai ver!”, “Preciso tomar uma atitude agora!”. Mude por uma outra forma de egoísmo: um egoísmo inteligente, e não esse, estúpido, que trabalha contra os próprios interesses, e faça realmente aquilo que vai concorrer para seu bem estar. E, sem dúvida, conter os impulsos de ciúme, como os de gula a que aludimos antes, e todos os demais ímpetos passionais, é o melhor que se faz para acentuar o próprio prazer e reduzir a dor pessoais.

Portanto, o domínio próprio não é algo que vá de encontro aos interesses pessoais, mas que os rege, intensifica-os e mesmo viabiliza-os. Ser controlado não é ser contido, reprimido ou não-natural, mas apenas ter tomado a opção pelo caminho da inteligência, do bom senso e do equilíbrio, da lucidez e da sabedoria, que propiciam não só a satisfação adequada dos sentidos, como a felicidade do espírito, conduzindo o indivíduo a uma magnífica experiência de plenitude e paz, pelo atendimento equilibrado de todos os aspectos e departamentos de sua totalidade indivisa.

(Texto recebido em 3 de maio de 2003.)