Benjamin Teixeira de Aguiar − Eugênia, a série Matrix de cinema está criando “frisson”, não só entre adolescentes e cinéfilos, mas até em certos segmentos da comunidade científica, com a afirmação surpreendente, por parte de alguns, de que a probabilidade de que a tese fundamental de Matrix seja verdadeira seria de 25%. O que nos diria sobre isso?

Espírito Eugênia-Aspásia − Que é verdadeira. Mas não no sentido literal de uma mega-programação cibernética interativa delusória-escravizante de toda a espécie humana, com o fito de vampirizá-la, para a função de mantenedora energética de um exército de máquinas, mas sim como um determinado nível de desenvolvimento e de despertar da consciência, que ainda não nota o número de dobras da realidade em que se encontra, assim precisando desdobrá-la, à medida que evolui, para enxergá-la com maior clareza.

BTA − Talvez descubramos que o nível 2 de realidade, dentro da tese da série Matrix, seja outro nível de realidade virtual, já que o “mocinho” “Neo” apresenta, ao final do segundo filme da série, poderes semelhantes ao que tem dentro da Matrix, como os telecinéticos, entre outros pequenos sinais. Caso isso se confirme no terceiro filme da série, que a encerra, o que poderia nos dizer sobre isso?

EEA − Que, confirme-se ou não essa hipótese, existe isso na realidade. Expliquemos: quando as criaturas humanas desencarnam, despertam do sono da existência nas estruturas biológicas-materiais e descobrem um universo infinitamente mais rico e complexo, no plano extrafísico de vida, que é, para muitas das consciências que aí estagiam, a realidade última das coisas. Todavia, adiantando-se ainda mais, no carreiro evolutivo, a consciência se deslinda do nível astral ou perispirítico ou psicossomático ou energético − como se queira chamar − e acorda para um nível ainda mais alto de expressão de existência: o mental. Mas esse, por sua vez, não é o último, e passa-se ao nível causal, que, por sua vez, ainda também não constitui a última realidade das coisas, e o indivíduo, por fim, mergulha no plano do Absoluto, do espírito puro, e, destarte, conecta-se à eternidade − essa sim o último nível da realidade, ou o mais verdadeiro, se é que assim podemos dizer.

O mais importante, todavia, a considerar, em termos pragmáticos e psicológicos, colimando o bem estar e o crescimento de nossos leitores, é que tanto se pode compreender que todos os níveis de realidade anteriores ao da “eternidade” são delusórios, como que são, por outro lado, formas específicas de a realidade se manifestar, sem que propriamente constituam modos diferenciados de ilusão.

“Samsara” e “nirvana” − emprestando-nos aqui a nomenclatura budista − são aspectos de uma mesma realidade, transcendente, que não pode se restringir a algo em contraposição a outra coisa, e que, por ser absoluta, deve estar em toda parte e em lugar nenhum, ao mesmo tempo.

Minha proposta, portanto, é a de, em vez de alguém ficar deprimido por descobrir que o sabor de doce da torta de chocolate pode ser reduzido a um conjunto de impulsos elétricos em seu cérebro, que desfrute do prazer de degustar a fatia de torta, independentemente de compreender ou não esse processo como algo mecânico ou quase isso, no interior da neurofisiologia.

Pouco importa, portanto, que todos estejamos distantes da verdade absoluta. Podemos usufruir da alegria relativa ao grau de conhecimento da verdade que já detemos, e, assim, respeitar nossa imperfeição, no plano perfeito de relatividades em que nos encontramos. Cada imperfeição é perfeita dentro do contexto de imperfeição em que está ínsita. É de extrema importância que se apreenda esse conceito, já que não o tê-lo em si pode compelir o indivíduo a “vícios espirituais”, como denominam alguns autores norte-americanos, como a “prisão de responsabilidade”, que vemos naquelas figuras exageradamente sisudas, graves e profundas, que se sentem esmagadoramente decepcionadas com o mundo físico e que, assim, vivem a se sentir angustiadas e entediadas por não poderem, ato contínuo, imergir no absoluto. É uma atitude a um só tempo patética, arrogante e estúpida. Vemos muito isso entre aqueles que supõem ter alcançado a iluminação e que só estão sendo vítimas, na verdade, de surtos de megalomania, egocentrismo e narcisismo. São criaturas que merecem nossa piedade, aprisionadas em seu castelo fantasioso de superioridade do ego, colocando-se em antagonismo a toda a humanidade, que veem como ignorante e inferior, enquanto não notam quão infelizes e angustiados eles mesmos estão, sem notarem o quanto isso também é um comportamento neurótico (porque nega a realidade em que se está inserido, inclusive o nível de desenvolvimento psíquico e consciencial em que se está − ou não se estaria encarnado) e, portanto, também uma expressão delusória de consciência de que deveriam tentar se evadir.

BTA − Fabuloso, Eugênia. Você é realmente a nossa “Sofia”, nossa “Pallas Athenéia”!…

EEA − Isso não tem a menor importância para esse assunto. Que se apreendam os fatos ou as ideias aqui ventilados e se os incorporem à vida, como acréscimo de valores à felicidade, à segurança e à paz, e estarei satisfeita.

BTA – Algo mais a acrescentar ao tema?

EEA − Não, satisfeita.

Benjamin Teixeira de Aguiar (médium)
em diálogo com Eugênia-Aspásia (Espírito)
2 de novembro de 2003