A vida é extremamente complexa e imprevisível. Não pretenda colocá-la, amoldá-la e aprisioná-la em esquemas pré-fabricados de concepção e interpretação da realidade, a fim de obter segurança e previsibilidade. Sofrerá, com essa atitude equivocada, decepções mais severas e de implicações mais graves de destino, além de perder, paradoxalmente, o nível de segurança e relativa previsibilidade que poderia obter, sendo mais inteligente e realista, ao partir da premissa de que, de fato, a vida é por demais intrincada e multidimensional, para ser lida de modo linear.

A vida é imprevisível, porque, da perspectiva do ser em processo de evolução, tudo está em elaboração, em formação, já que só se enxerga fora de si o que há dentro de seu coração. E como o ser evolue, tudo externamente também sofre contínuas modificações projetivas.

Não dá para se quantificar a enormidade de vezes que algo foi tido como ético, justo e bom, e não passava de manipulação mesquinha de interesses instituídos por determinadas elites dominantes, no seio das sociedades humanas. A moral, os costumes e os princípios de religião, justiça e direito são valores condicionados a cultura, tempo e lugar. Não é possível escapar a esse relativismo onipresente, na condição de todo ser e grupo de seres sencientes, em processo de ascese evolutiva. A não ser que se pretenda vivenciar ilusões mais do que o estritamente necessário (porque as ilusões são inevitáveis, em algum nível, para quem não atingiu o plano do Absoluto). Ignorar tal fatalidade inamovível é cair-lhe nas redes macabras, com ainda maior prejuízo, inclinando-se a toda forma de fanatismo e dogmatismo intolerantes (inclusive os “científicos”), apesar da boa-vontade daqueles que combatem os atuais excessos nas considerações licenciosas ilaídas do relativismo cultural e moral, que, em muitos sentidos, é confundido com cinismo e amoralidade, quando tais posturas revelam, tão-somente, a baixa maturidade psicológica daqueles que as apresentam.

Em outros aspectos cotidianos, mais próximos do homem e da mulher comuns, o mesmo princípio de imprevisibilidade se mantém inalteravelmente presente, com toda pujança: o inimigo da véspera pode se converter em forte aliado no dia seguinte; o amigo de hoje torna-se o maior rival de amanhã; o sonho de amor se converte em pesadelo; a profissão ideal mostra-se forja de angústia; o tesouro encantado converte-se em vazio e tédio; o que se tinha por tudo transforma-se, inapelavelmente… em poeira e nada… Tanto quanto o que parecia destituído de sentido e propósito aparece como fonte de vida e felicidade, e o tudo é descoberto, a partir de pequenas aparentes insignificâncias do caminho…

Claro que, às vezes, o planejado segue a rota que lhe foi pré-estipulada, e a vida toma nuances racionais e claras. Mas não conte que isso ocorra sempre. Muito pelo contrário, elimine essa expectativa, porque a vida seguir o “script” da programação previamente delineada é a exceção e não a regra.

Mantenha a mente aberta. Onde menos você esperar, encontrará surpresas, tanto negativas, quanto positivas. Em um momento de crise, pode receber socorro de onde menos supunha encontrar solidariedade. E, no instante de sucesso, poderá encontrar inimizades, antes impensadas, onde menos acreditara poderem estar. Ideias novas, metodologias de trabalho diversas, novos campos de atividade, de criatividade, novas oportunidades de se expandir, de ativar potenciais ocultos e de vivenciar sentimentos desconhecidos ou adormecidos – a vida é um festival contínuo de transformação e acontecimentos inesperados, e somente quem está aberto a toda sua inebriante riqueza está suficientemente gabaritado a fluir com suas torrentes de acontecimento e significado.

Assim sendo, não tenha medo, jamais, da mudança. Seria a maior estultícia que poderia cometer consigo mesmo, emperrando as engrenagens da vida para o inexorável, deste modo candidatando-se a ver os mecanismos de sua psique e de seu destino serem arrebentados, pela pressão do tempo e pela “força das coisas que têm que acontecer”, em vez de bailar com o fluxo da vida e não só com ele se divertir, mas dele tirar benefícios inautidos…

Dentro dessa “dança mística”, desse “ballet cósmico” – como têm denominado os filósofos contemporâneos da Física Quântica, endossando a assertiva de grandes místicos do passado – seja fiel a um único princípio: seu coração. Não se violente jamais, seja para agradar pais, filhos, cônjuges, amigos, superiores hierárquicos ou liderados, costumes ou convenções sociais, expectativas culturalmente introjetadas ou neuroses suas ou dos outros. Siga apenas o que seu coração ditar. E por coração queremos dizer o mais fundo do seu ser, a voz da superconsciência, que sabe exatamente para onde deve ir, a sabedoria do seu Eu Profundo, a voz da serenidade, da paz e da bem-aventurança, do sentimento de dever cumprido e de vida completamente vivida, que está além de ideias pré-concebidas do que é certo ou errado, mas que sempre flui em direção à vida, à plenitude, e, com isso, em direção à espiritualidade e a Deus, acima de qualquer tipificação ou especulação aceitas ou apreendidas, por meio da cultura ou da educação.

Cuidado, principalmente, com aquilo a que julga dever obedecer, por ser considerado absoluto, por ser tido como a vontade de Deus, seja proveniente de um texto tido por sagrado ou de um guru ou mentor espiritual, vistos como santos. Respeite tradições, livros sagrados ou homens santos, mas lembre-se que todos precisam ser submetidos ao filtro de seu discernimento, ou serão muito mal-compreendidos, para não dizer tragicamente interpretados. As guerras santas de todos os tempos, sempre baseadas na autoridade de líderes e textos tidos como representantes diretos da Divindade, que sirvam de exemplo. Nada há de absoluto, no plano de relatividades em que todos estamos inseridos, enquanto não alcançamos a perfeição. A interpretação de textos ou de vozes espirituais pode ser completamente distorcida, pela mente e suas intrincadas elaborações, padrões neuróticos e psicológicos, de raízes variadas e confusas. Siga a sua intuição mais profunda, e, mais tarde, ainda que no momento contrarie a voz dominante da cultura, do seu ego e de sua vaidade, descobrirá que sempre fez o que Deus quis, embora não tivesse como saber, no instante de sua eclosão.

Aprenda, assim, a auscultar a voz mais profunda de si. É o que têm dito todas as grandes religio-filosofias do passado e do presente, é o que têm ensinado os grandes luminares de todas as épocas e culturas; é o que o seu próprio ser lhe pede: que você seja você próprio, na plenitude de seus potenciais e de sua graça, de sua originalidade e de suas idiossincrasias, de sua sanidade e de sua “loucura”, de sua vida e de seu poder, de seu saber e de seu amar, de seu dar e de seu fazer, de seu receber e de seu tornar-se.

Se você não for você mesmo, ninguém poderá ser, em seu lugar. Se você não der hoje o que pode, não dará amanhã, porque já será outra pessoa, com outras necessidades, sentimentos e compreensão do mundo. Se você não fizer por você e pelo mundo, por consequência, tudo que está a seu alcance, a perda irreparável resultante ecoará no infinito, a aturdi-lo, eternamente.

Pare de se preocupar em atender a esquemas de pressuposição de verdade ou de expectativas de desempenho e comportamento, valores e metas externamente impostos. Só há verdade, na câmara secreta do próprio coração. Quem não a ouve, não vive: existe, vegeta, e é sugado em seu ser, até a total perda de sentido da vida, de ser e de sentir, convertendo-se em um zumbi tétrico e medonho… para si mesmo, um vampiro do próprio coração, com a alma assassinada por si próprio, no desatino de escolhas mal-feitas, amiúde tragicamente irreversíveis… e irreparáveis,por, não raro, muitos séculos…

Cuidado com as ideias deterministas e fatalistas que castram a originalidade, a criatividade e o sentido de propósito e realização pessoal. Até o universo psíquico dos mitos e dos arquétipos, que, em primeiro exame, parece fossilizado, constitui força viva e mutante, a todo momento sofrendo interações e consequentes alterações, no contato contínuo com os seres humanos. O futuro não está pré-estabelecido. Ele é arquitetado, a todo momento, pela força do espírito que se move “para onde quer”, nos dizeres da palavra crística. Linhas gerais de acontecimento são traçadas, antes da reencarnação dos indivíduos, mas podem perfeitamente ser refeitas, em novas programações existenciais, que incluam estratégias de realização e desdobramento de novas realidades e conceitos, sentimentos e significados, valores e princípios recém-descobertos.

Do caos sempre surge uma ordem implícita, num nível mais elevado de complexidade, afirma, categoricamente, a Ciência da Complexidade, o mais avançado ramo das matemáticas (paradoxalmente, desenvolvida a partir das linhas de veia mais deterministas da ciência dos números). E a vida, amigo, para qualquer pessoa ligeiramente perceptiva, é constituída por pequenos filetes e caudalosas torrentes de caos…

Não se limite, ou o mundo lhe apresentará limitações de todas as ordens, de todos os lados, por todos os modos, a começar dos recôncavos mais profundos de você mesmo, d’onde ouvirá suas entranhas, demonizadas no desprezo a que foram relegadas, clamarem, sinistramente: “Prova, ó louco revel de si próprio, o fel da desgraça que escolheste, porque, se desististe de ser o si-próprio, abandonaste a vida, e só podes, assim, experimentar o frio, a fome e a morte, onde quer que estiveres.”

Benjamin Teixeira de Aguiar (médium)
Temístocles (Espírito)
25 de setembro de 2003

(*) Brilhante como sempre, Temístocles parece haver se superado neste artigo belíssimo, rico, profundo e impactante, que recebi dele, psiquicamente, há duas semanas atrás. O prezado leitor provavelmente concordará. Para quem se der ao trabalho de lê-lo com critério e vagar, poderá esse texto lapidar do grande mentor-analista do Projeto Salto Quântico constituir um forte estímulo para o despertar da consciência, num nível mais alto de expressão, um verdadeiro sacolejo consciencial, um triturador de ilusões.
(Nota do Médium)